Aprender a falhar com uma ceramista

Foto: Ramos Cerâmica

 

Vamos falar sobre o elefante na sala? Se queremos que esta grande experiência coletiva que é a criação de um modelo de trabalho híbrido resulte, precisamos de criar espaço para as pessoas errarem.

Já em 2013, num manual sobre trabalho remoto que hoje parece uma carta escrita aos líderes do futuro, Jason Fried e David Heinemeier Hansson defendiam: “Como manager, vais ter que aceitar que as pessoas vão cometer erros, mas não de forma não intencional, e que os erros são o preço a pagar pela aprendizagem e pela auto-suficiência”. 

Num cenário em que os dias de trabalho deixam de coincidir no tempo e no espaço, as pessoas precisam de saber que podem errar, para que sejam capazes de tomar decisões quando ninguém está a olhar. 

As empresas podem e devem implementar algumas práticas e iniciativas que normalizem o erro em termos culturais, mas parece-me que o fator preponderante na criação de um contexto em que falhar seja seguro é o comportamento que cada líder assumir individualmente perante as falhas, sejam elas próprias ou alheias.

Poucos adultos que tenham passado pelo sistema de ensino convencional estarão, porém, preparados para celebrar o erro em contexto profissional. Foi por isso, na tentativa de descobrir como facilitar este processo de aprendizagem, que decidi falar com alguém que faz dos erros formas de arte.

 
 

O trabalho da Patrícia não é perfeito. Tem marcas, dedadas, variações na forma, no tamanho e na cor. 

Quando criou a Ramos Cerâmica, decidiu que seria 100% transparente em relação ao seu processo de criação. Isso implicaria, naturalmente, partilhar os erros que dele fazem parte. Mais do que tornar visíveis os defeitos das peças, decidiu dar-lhes nomes e histórias, torná-los dignos, celebrá-los. Foi assim que nasceu a “menina e moça”, construída à mão e sem moldes, e foi também assim que a partir daí tomaram forma milhares de outros corpos, todos diferentes entre si.

Se a roda de oleiro lhe trazia a pressão da exigência para que tudo ficasse perfeito e liso, quando ficou a sós com as mãos e o barro, em cima de uma tábua de madeira, foi capaz de, no silêncio, deixar de ouvir as vozes críticas que viviam dentro de si e escutar outra conversa, mais rica, mais cheia de significado e vida. Cada peça é como um diálogo que ganhou forma. 

“É bom observar as minhas peças e perceber onde houve pressão dos meus dedos, seguir os movimentos que fiz, ver de que forma o barro respondeu ao que lhe pedi.”

Nuas ou vestidas, com sardas ou barrigudas, tímidas ou sem vergonha, altas ou baixas, magras ou largas, todas as suas peças contam histórias feitas de hesitações, de erros e de imprevistos, mas também de persistência, de coragem e aceitação. 

Neste caminho, o barro tem sido um bom Mestre. 

“O barro ensinou-me que trabalhar irritada, nervosa e zangada nunca dá bom resultado. Não há como tornar a cerâmica imediata, muito menos quando estamos a trabalhar sozinhos e sem moldes.”

Ser ceramista é, na perspetiva da Patrícia, encarar a imprevisibilidade como fonte de informação. Mesmo repetindo processos e materiais, há sempre um conjunto de fatores que não se controlam e que têm impacto no resultado final. Essas variações são, por sua vez, material de estudo: há que observar, analisar e aprender com elas. 

 Talvez a chave para, enquanto líder, ser capaz de ver valor nos erros, possa estar, então, nesta ideia: a de que falhar é, antes de mais, uma oportunidade de aprender. 

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Créditos das fotos:

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